quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Sopas e descanso



Foram mais quase 15 dias de sopas e descanso! Das sopas falaremos mais à frente, do descanso também.
Quando isto começou a aquecer, até temperaturas que ultrapassaram os 39.5° foi tempo de partir com uma certa urgência. Os primeiros dias foram complicados e senti-me como tendo sido atacado por uma máquina de costura em pleno funcionamento com picadelas sucessivas a um ritmo alucinante.
Finalmente descobriu-se o bicho, daqueles que todos nós temos cá dentro, mas que em alguns casos decide proliferar anormalmente. Uma vez descoberto o agente foi-lhe atribuído o bombardeamento antibiótico correspondente e a temperatura acalmou.
Mas mais do que resolver pontualmente um problema, os generais estavam preocupados com a sua origem. Daí a razão de todas aquelas picadelas de que vos falei acima e de todo um conjunto de análises e exames que perscrutaram as minhas entranhas.
Após esta panóplia de despistagens foi colocada como hipótese mais provável alguma afectação da prótese biliar. No dia seguinte fui transferido. Foi uma das viagens mais atribuladas da minha vida. Era já o fim do dia e o condutor já devia estar farto de atrasos. Quando a luz verde aparecia e o caminho estava livre arrancava desarvoradamente por cima de toda a pedra. Mesmo constantes solicitações de calma por parte do acompanhante não surtiram qualquer efeito. O ar meio alucinado, o cabelo “rasta” e o olhar parado são indícios fortes de que ..digamos ...estava com o pé pesado e com a cabeça leve!
Enfim ... o tubo foi alargado, foi limpo e até uma parte acrescentada para facilitar a saída da bílis. Felizmente correu tudo bem!

Prometi-vos que falava um pouco de comida e aqui vai. A França é mundialmente conhecida como o país dos requintes gastronómicos. O que vos posso garantir é que nenhum desses requintes veio parar aos castelos onde passei a última quinzena. Curiosamente a maior parte dos pratos tem um gostinho internacional: carne à bolonhesa, pepinos com molho húngaro, paelha à espanhola (a pior paelha que já alguma vez fui obrigado a comer). Em suma um rol de iguarias que, em tempos de globalização, até não parecerá má ideia. Creio, no entanto, perceber alguma mensagem subliminar de degradação da cozinha internacional em favor da francesa! Não era preciso tanto!
Uma última nota sobre o descanso. Já várias vezes tive oportunidade de escrevinhar sobre este assunto ao longo deste blog, mas não posso deixar de vos contar uma pequena história.
Desta vez tive a sorte de ficar num quarto sozinho, podendo beneficiar de um certo silêncio e de uma grande vidraça onde o sol tocava todas as manhãs. 3 a 4 vezes por dia, de um quarto relativamente perto ouvia-se o urrar estranho, ininteligível de um dos nossos vizinhos. Era um som que cortava o silêncio de forma a deixar os cabelos em pé. De início conjecturámos, eu e uma vizinha portuguesa do quarto do lado, que seria alguém a reclamar do tratamento, um alcoólico em último grau a demandar o seu copo, ou algo do género.
Afinal tratava-se apenas de uma pessoa com deficiência que não gostava do vizinho de quarto.
Depois de 3 dias o seu vizinho foi para outro quarto e finalmente há silêncio. Agora está sozinho num quarto de 2. É que nunca se sabe quando ele se vai fartar de estar sozinho!

domingo, 7 de setembro de 2008

Portas e cerveja

O ataque aos maus fígados começou! Uma visita de 3 dias para absorver a boa química e para avaliar os efeitos colaterais das últimas batalhas.
Foi a primeira vez em que fiquei num quarto com 3 portas! A porta de entrada, a porta do WC e o meu companheiro que era surdo como uma porta. À sua chegada já me encontrava no quarto na companhia da minha querida Cláudia. Sem nos dirigir o mais pequeno dos esgares dirige-se titubeante para o leito respectivo. Sem uma palavra... De início foi surpreendente pois é habito por estas paragens a chegada de alguém ser acompanhada por um educado “bonjour” mesmo quando alguém entra no elevador ... quanto mais quando se entra no quarto que se vai partilhar nos próximos dias. No entanto não foi necessária uma grande espera para esclarecer as razões de tal comportamento. O primeiro diálogo (se assim se pode chamar) com a funcionária que lhe veio dar as boas vindas, foi muito interessante: Alors Mr. B. comment ça va aujourd’hui? E a resposta: Si je suis venu à minuit? Non ! Je viens d’arriver.
Esta estada foi aproveitada, para além de absorver lenta e seguramente a droga que vai dar cabo dos caranguejos, para contrabalançar alguns dos efeitos indesejáveis das últimas pelejas. Um deles prende-se com uma respeitável, mas desconfortável barriguinha que agora evidencio. Ela resulta da acumulação de líquidos dentro do ventre e impunha-se o seu esvaziamento. Foi isso mesmo que aconteceu e, após uma picadela em lugar estratégico na zona abdominal, comecei o longo processo de esvaziamento. No final resultaram uns 3 litros e meio de um líquido de cor dourada. Em conversa com o general, mais tarde, tive que confessar que em tempos de juventude cometi alguns excessos: Umas cervejitas a mais, sem nunca perder o norte. Lembro-me por exemplo de algumas visitas aos bares típicos de Antuérpia (acompanhando equipas de Corfebol) com cartas de 350 marcas diferentes de cerveja que estimulava um comportamento menos comedido. Agora foi o tempo de pagar por esses excessos. Por outro lado, em pouco menos de 4 horas de uma quase imobilização e de esvaziamento lento, no final resultou menos barriga, menos pressão interna e muito mais conforto. Só não aconselho porque a maior parte das bariguinhas que andam por aí já metabolizaram a cervejita toda em gordura e isso não se reduz assim tão simplesmente.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Férias e fígados



Foi a primeira vez que passei um mês de férias inteirinho em Paris. Foi uma sensação estranha! Férias, no meu dicionário, significa praia, mar, areia escaldante, brisa fresca e húmida, vento quente, mergulhos em águas cálidas e, sobretudo, uma boa dose de nada!
Desta vez, Paris, trouxe-me a chuva intensa, o frio arrepiante oscilando com o calor de estufa, o vento frio, nuvens carregadas e por vezes o sol espreitando timidamente por entre os farrapos de algodão.
Enfim, estes tempos têm que ser dedicados a outras causas em que o tempo que faz é indiferente, ... e é nisso que me concentro agora.
Os últimos tempos têm sido de alguma ansiedade à espera dos resultados do TAC que fazia o balanço dos últimos desenvolvimentos. Apesar de as notícias não serem as melhores, há sempre uma boa notícia por trás das más. Os caranguejos do pâncreas parecem ter parado de crescer, o que é uma boa notícia, no entanto, o fígado tem sido invadido por uma corja destas infames criaturas.
Já me tinham dito que, de vez em quando, mostrava maus fígados, ... mas não queria acreditar. Agora parece evidente que devem ter razão! Os indicadores fisiológicos já faziam crer dessa evidência, mas poderia ser por variadas razões. Agora sabe-se mesmo que os caranguejos decidiram migrar em força para terras “figadais”.
As boas notícias, que se escondem por trás das más, é que felizmente existem alternativas e aqui em Paris não existem limitações quanto ao uso de moléculas, entretanto descobertas, por mais recentes que sejam, para o combate aos caranguejos.
É já amanhã que vou entrar num novo patamar de cura, utilizando outras drogas que, espero, desempenhem a missão com mais afinco. De 15 em 15 dias tenho 3 dias de permanência no castelo para lenta e profusamente absorver a química necessária à erradicação destes bichos horrendos.
Vai ser desta! Vou conseguir! Vamos conseguir!